ATA DA QUADRAGÉSIMA QUINTA SESSÃO SOLENE DA SEXTA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA NONA LEGISLATURA, EM 13.09.1988.

 


Aos treze dias do mês de setembro do ano de mil novecentos e oitenta e oito reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Quadragésima Quinta Sessão Solene da Sexta Sessão Legislativa Ordinária da Nona Legislatura, destinada à entrega do Título Literário "Érico Veríssimo" à Escritora Jane Fraga Tutikian, concedido através do Projeto de Resolução nº 48/87 (proc. nº 2448/87). Às dezessete horas e vinte e seis minutos, constatada a existência de "quorum", o Sr. Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Ver. Brochado da Rocha, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Poeta Luiz de Miranda, representando, neste ato, o Prefeito Municipal de Porto Alegre; Prof. Joaquim Felizardo, Secretário Municipal de Cultura; Dr. Luiz Antônio Proença Fernandes, Coordenador Estadual da Secretaria Especial de Ação Comunitária; Escritora Jane Fraga Tutikian, Homenageada; Dr. Edemar Morel Tutikian, Esposo da Homenageada. A seguir, o Sr. Presidente concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Ver. Flávio Coulon, em nome da Bancada do PMDB, discorreu sobre a importância da presença feminina na arte poética, comentando a contribuição dada pela Homenageada a nossa cultura, seja através de sua obra literária, seja através de sua atuação no setor educacional. O Ver. Brochado da Rocha, como proponente da Sessão e em nome das Bancadas do PDT, PDS, PFL, PL, PCB e PC do B, teceu comentários sobre o significado do Título Literário "Érico Veríssimo", hoje concedido à Escritora Jane Fraga Tutikian, como o reconhecimento da comunidade porto-alegrense aos seus valores literários. E o Ver. António Hohlfeldt, em nome da Bancada do PT, analisou a obra literária da Homenageada, ressaltando o conhecimento que possui S.Sa. do valor e da força da palavra dentro da sociedade atual e o uso por ela feito dessa força da palavra na luta pela liberdade e pela descoberta do ser humano. A seguir, o Sr. Presidente procedeu à entrega do Título Literário "Érico Veríssimo" à Escritora Jane Fraga Tutikian e concedeu a palavra a S.Sa., que agradeceu o título recebido. Em continuidade, o Sr. Presidente fez pronunciamento alusivo à solenidade, convidou as autoridades e personalidades presentes a passarem à Sala da Presidência e, nada mais havendo a tratar, levantou os trabalhos às dezoito horas e oito minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelos Vereadores Brochado da Rocha e Flávio Coulon, o último nos termos do art. 11, § 3° do Regimento Interno, e secretariados pelo Ver. Flávio Coulon, como Secretário "ad hoc". Do que eu, Flávio Coulon, Secretário "ad hoc", determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada será assinada pelos Senhores Presidente e 1ª Secretária.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Brochado da Rocha): Declaro abertos os trabalhos que a Câmara Municipal de Porto Alegre, em Sessão Solene, concede o Título Literário "Érico Veríssimo" à escritora Jane Fraga Tutikian. Como é praxe da Casa, em primeiro lugar, gostaria de saudar os Senhores e Senhoras, autoridades presentes e representadas, especialmente os componentes da Mesa, mais especialmente, a Homenageada de hoje e dizer que esta Casa se faz ouvir através de suas Bancadas, motivo pelo qual passamos a palavra ao Sr. Ver. Flávio Coulon. S. Exa. falará em nome da Bancada do PMDB.

 

O SR. FLÁVIO COULON: Sr. Presidente e Srs. Vereadores, Sra. Homenageada, autoridades aqui presentes, meus Senhores e minhas Senhoras. "O sonho é bem capaz de transformar todas as coisas, mas, para que se realizar a alquimia que transforma o sonho em realidade, é preciso muito, mas muito mais do que sonhar: é preciso fazer."

Este conceito, me parece, seria mais do que suficiente para definir quem é Jane Fraga Tutikian. Resume sua posição frente à vida, frente ao processo de criação, frente à própria condição feminina. Pois, em todos estes casos, quem se limita ao sonho permanece inerte no caminho. Não faz. E Jane, mais do que qualquer outra coisa, é uma construtora, digna representante das tradições culturais da mulher gaúcha.

Guilhermino César já lembrou que "nesta estremadura sulina, velho acampamento de guerra, a mulher precocemente se distinguiu na luta com a palavra. Enquanto o macho brigava com os inimigos de fora, ou dentro de casa, uma parcialidade política combatia a outra, Penélope tecia... Mas aqui a teia foi outra que não a da heroína mitológica. Não espanta, por conseguinte, que o primeiro autor gaúcho a imprimir livro de versos haja sido a "poetisa cega" do Rio Grande de São Pedro, a chorosa Delfina Benigna da Cunha, no ano de 1834".

Mestre Guilhermino nos remete ao passado para registrar a força da criação literária das mulheres gaúchas, mas ele mesmo também especula sobre o futuro, fazendo suas as palavras do crítico João Pinto da Silva, ao imaginar que "em futuro não muito remoto, a mulher há de suplantar ao homem no que concerne à criação artística propriamente dita. E isto porque os barbados cada vez mais se deixam absorver pelos negócios, pela técnica, pelos engenhos mecânicos, enquanto suas companheiras, desfrutando de lazer para se instruírem, chegaram a um estágio cultural que lhes permite competir vantajosamente com o outro sexo no plano da vida mental. Além disso, pela circunstância de se mostrar mais permeável ao sentimento, aos afetos, à translinguagem da poesia e do inefável, o sexo feminino tem a seu favor uma intuição estética e uma acuidade sensorial muito desenvolvidas".

Mudou bastante a situação feminina, desde que João Pinto da Silva elaborou seus conceitos. Hoje não se pode dizer que as mulheres possam "desfrutar de lazer" para se instruírem. O que não se refletiu em sua capacidade criativa; pelo contrário. Jane Fraga Tutikian é o mais perfeito exemplo da mulher escritora de hoje. Sem perder a permeabilidade aos sentimentos, sem abdicar das nuanças mais profundas da condição feminina, ela registra em sua obra as perplexidades dos tempos atuais. E não só isto. Ao mesmo tempo que desenvolve uma carreira literária elogiada de forma unânime pela crítica, não abre mão das lutas pessoais, na difícil trincheira do magistério público.

Nada, portanto, de "desfrutar do lazer". Jane é, antes de tudo, uma batalhadora, a carregar em si a força de uma Ana Terra ou de uma Bibiana Cambará. Nada mais justo que receba o prêmio literário Eriço Veríssimo. Não apenas pelo prêmio em si, mas principalmente pela estreita vinculação que existe entre o que ela é e as personagens que Érico construiu. O Érico, que sempre criou personagens femininas de grande força, mulheres que reuniam na ficção aquilo que nossa Jane Fraga Tutikian representa na prática: a perfeita união entre força e sentimento.

Poucas vezes este prêmio foi tão bem conferido, ultrapassando os limites do valor literário, e chegando a uma completa identidade pessoal. Pois, na medida em que é uma mulher inteligente, batalhadora e bonita (e quero voltar a ressaltar a importância da beleza neste contexto, como já fiz na homenagem a Evelyn Berg Ioshpe, pois ela, a beleza, faz parte da condição feminina), na medida, dizia, em que é uma mulher inteligente, batalhadora e bonita, Jane contribui para a construção de um novo tempo nas relações humanas. Com sua obra, com sua atividade contínua no magistério, com as batalhas que trava como diretora de uma escola pública, Jane é um exemplo para todos nós, homens e mulheres.

Não gostaria de encerrar sem lembrar aqui outra grande mulher. Ela foi uma das alavancas que incentivou o trabalho de Jane Tutikian nos primeiros tempos. Em seu Laboratório de Criatividade Literária, muitos dos atuais escritores gaúchos encontraram seu rumo. Tenho certeza de que, neste momento, um pouco das memórias de Jane estão com Lygia Averbuck. Ela já morreu, mas deixou um trabalho que ainda hoje produz resultados. Por isto, ao mesmo tempo que lembro Lygia, nesta homenagem a Jane, gostaria de encerrar homenageando também a todos os homens e mulheres que lutam por um ideal, citando novamente nossa Homenageada e deixando aqui suas palavras como um tema para reflexão:

"O sonho é bem capaz de transformar todas as coisas, mas para que se realize a alquimia que transforma o sonho em realidade é preciso muito, muito mais do que sonhar: é preciso fazer". Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Flávio Coulon): Com a palavra o Ver. Brochado da Rocha, autor da proposição, que falará em nome das Bancadas do PDT, PFL, PDS, PL, PCB e PC do B.

 

O SR. BROCHADO DA ROCHA: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, Escritora Jane Tutikian, meus Senhores e minhas Senhoras. Teria um sem-número de dados, aqui, sobre a vida e a obra de Jane Tutikian. Foi, em verdade, há muito tempo, em que, em contato direto - posso dizer - com a Vovó Edith que me debrucei sobre a obra e sobre o conceito dos nossos críticos a respeito do trabalho da Homenageada. Mas prefiro, neste momento, fazer primeiro uma reflexão que sei será muito do agrado do nosso Secretário de Cultura do Município de Porto Alegre, e foi intuito desta Câmara estabelecer um prêmio literário que ano a ano temos apresentado a vultos rio-grandenses, a vultos porto-alegrenses, especialmente, muito próximo a Vovó Edith, que tem colaborado tanto conosco, o trabalho das pessoas não é individual, mas entendíamos nós que era um compromisso desta Casa, Sr. Secretário, realmente destacar; permito-me, também, num momento de desprendimento, ou largando de mão a autocrítica, tão própria de nós, que temos raízes tão profundas no positivismo, dizer que nós, do Rio Grande do Sul, nós, de Porto Alegre, temos uma profunda noção de senso crítico, e antes de qualquer coisa, Jane, nós procuramos um a um, dentro da sociedade em que vivemos, apequenados, sempre, e esta tem sido uma constante nas artes, em outras atividades quaisquer que nós temos feito. Quase que poderíamos dizer que tem sido uma constante em nossa terra, que comumente se chama uma patrulha, ou seja, imediatamente alguém, ao criar alguma coisa, recebe de todos nós, da sociedade porto-alegrense uma crítica muito forte. Uma crítica muito destrutiva, a tal ponto, com a permissão do Sr. Secretario de Cultura do Município de Porto Alegre, que além do Título, além do cargo, é um homem de letras, dizer que este fato e esta circunstância que envolve a nós, porto-alegrenses e gaúchos, a praticamente anularmo-nos, destruirmo-nos, dizendo, Jane, que acho mais importante isto, que talvez, em qualquer lugar do Brasil, seria muito mais fácil fazer uma obra, fazer um nome e fazer um trabalho. Nós somos extremamente intolerantes com nós mesmos. A intolerância é uma tônica e uma crítica constante que parte de nós para nós mesmos. Uma autocrítica muito severa. Não é por acaso que o Rio Grande do Sul, que Porto Alegre tem, no correr dos tempos, não logrado os êxitos correspondentes aos seus talentos. Me permito, com a vênia necessária do seleto auditório aqui presente, para discorrer num campo muito próspero. Nós temos excelentes juristas no Rio Grande do Sul, agora, nós temos muito poucos escritos, muito poucas obras de juristas gaúchas. Interessante para os Srs. e as Sras., observarem, no cenário nacional, estes juristas gaúchos aparecem ora como Consultor-Geral da República, ora como membro do Supremo Tribunal Federal, enfim, galgando cargos mais altos desta República e desempenhando as tarefas mais importantes.

 No entanto, o escrito é pouco. Poderia até me deter na figura de Ruy Cirme Lima, que era consagradamente o maior cultor das artes jurídicas, especialmente no campo do Direito Administrativo. No entanto, a sua obra é muito diluída. Ilustro isto para dizer o quanto é difícil chegarmos ao reconhecimento público, para dizer também que, se esta Casa presta homenagem, ela recolhe, como bem já expressou meu colega Flávio Coulon, das ruas, das pessoas, recolhe, enfim, dos segmentos que transitam por esta Cidade para depois trazer ao julgamento deste Plenário e depois vir a conceder o Título. Por isto, quero deixar a nossa Homenageada, que tem na apresentação do seu currículo, um currículo extremamente vasto, que, se fosse enunciar a todos aqui presentes, seria altamente exaustivo, confesso mesmo que não sei onde ela encontrou tempo para fazer, para realizar tantas tarefas, pois sabemos que o dia-a-dia é muito pesado, mas afinal ela conseguiu realizar isto. Tanto é que conseguiu realizar tantos cursos, traduções, tantas obras com tão pouca idade que, se fosse eu enumerar aqui, ao ler a Exposição de Motivos, onde constam esses trabalhos, eu tomaria o tempo dos Senhores, de um lado; de outro lado, os cansaria e acredito que cansaria, sobretudo, a nossa Homenageada, que afinal conhece o que fez e custou-lhe fazer. Por isso, como proponente deste título, como Vereador da Cidade de Porto Alegre, mas, sobretudo, como cidadão desta Cidade, sinto que o título ora concedido ele não se encerra na pessoa que o recebe, mas se mistura com a sua obra, o seu trabalho e abrange o espectro daquelas pessoas que seguem a sua trilha, que seguem o seu caminho e, sobretudo, cultuam os valores maiores da nossa sociedade, do nosso mundo, dos nossos desejos, dos nossos sonhos, das nossas inquietações, das nossas angústias. É sobretudo um trabalho manual, mas é um trabalho manual que transcende onde estamos, transcende as coisas que nos afligem e que fazem do papel algo muito parecido com a nossa vida, nosso anseios, nossas inquietações, dando para nós e para gerações futuras ensinamentos, um caminho e, sobretudo, uma história, um retrato da alma humana num templo, numa cidade, num lugar, numa rua, numa casa. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Brochado da Rocha): Com a palavra o Ver. Antonio Hohlfeldt pela Bancada do PT.

 

O SR. ANTONIO HOHLFELDT: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, meus Senhores, minhas Senhoras e minha querida Jane. Em 1981, quando da publicação de Batalha Naval, eu me encontrava, não pela primeira vez, com a Jane, mas, enfim, tínhamos uma relação em que o eventual crítico literário tinha uma tarefa de julgar a escritora estreante. Hoje, a posição é diferente. O Vereador, no encargo da representação popular, vem homenagear não apenas a escritora, mas também a pessoa, a cidadã Jane Tutikian. E, certamente, se eu tivesse tido a oportunidade de ser aluno da Jane, teria passado muito tempo extasiado, embasbacado com a Professora. Não tive esta chance; quero me juntar, portanto, e aqui dizer as boas-vindas ao Lauri Maciel, ao Paulo Hecker Filho, ao Sérgio Faraco, a dona Edite Hervé, sempre presente nestes momentos; à dona Domingas Faulace, uma poetisa que eu gosto muito, que respeito muito, a Lia Monteiro, que já trouxe algumas premiações para este Estado, e falar, sobretudo, numa coisa que a Jane nos dá como escritora e que é muito importante: que é ultrapassar o medo da palavra, que é uma característica dos últimos anos, desses anos de ditadura, desses anos de terror, desses anos de medo. Ontem, este Plenário desta Casa recebeu companheiros chilenos em campanha pela derrubada da ditadura. Hoje nós recebemos uma mulher, uma artista, uma pessoa que é capaz de ultrapassar este medo da palavra, fazer desta luta com a palavra a sua luta. Reconhecer o peso da palavra, a densidade da palavra, mas também o valor e a força desta palavra. Uma literatura num texto que todos nós, com toda a certeza que estamos aqui, conhecemos tanto, e que sempre digo que, quando a gente lê um texto da Jane, é como um pouquinho sussurrar, um pouquinho rezar, tem que ler baixinho, tem que ler devagar, não dá para aplaudir forte depois porque senão vai quebrar o clima criado. E, no entanto, é um texto que na aproximação sempre me lembra aquela passagem de Antonioni "Blow Up" pega um ponto e vai ampliando, ampliando, ampliando esse ponto até que ele nos toma, nos invade e realmente se impõe a todos nós como um ponto de atenção, como um momento em que a gente não pode mais fugir e onde a gente, de repente, surpreso, se encontra cara-a-cara com a gente mesmo. Há vários temas que se organizam nesse universo ficcional da Jane: a solidão e o estar só, que são duas coisas diferentes; um passado que é visto como algo irreversível, sem nenhuma nostalgia, que permite, inclusive, no presente, a gente ficar se interrogando, a todo momento, quem nós somos, que papel desempenhamos; certo sentimento de vazio que algumas personagens vivem, uma busca permanente de si próprio e, ao mesmo tempo, uma defesa intransigente da liberdade; uma valorização da amizade, num pequeno gesto e numa palavra mínima, num sorriso por vez, uma valorização; nesse pólo de esperança, apesar de tudo, da mulher e da criança; uma possibilidade da renovação, de um novo começar, de um novo projeto, em que a ação externa do ponto da Jane é apenas a projeção de uma ação que é interna, eminentemente da personagem. Tudo isso faz com que a escritora Jane Tutikian, o seu texto, a sua literatura, sejam eminentemente um texto, uma literatura modernos, contemporâneos, da crise, não da crise no sentido negativo, mas no sentido positivo, da viagem permanente que é a vida da gente, dos ritos de passagem como, aliás, já registrou o Prof. Donaldo Schüller, que caracterizam cada conto, cada momento, cada texto da Jane e, sobretudo, um recomeço permanente. Nesse sentido, acho que o conto final do último livro "Pessoas" é conto nesse sentido antológico. A idéia da viagem dentro de nós mesmos, a idéia da viagem dentro da nossa própria casa, dentro do nosso pequeno mundo, talvez a viagem mais difícil de a gente fazer do que aquela de largar tudo e se mandar por aí. Por tudo isso, Jane, esta homenagem é mais do que merecida, a ti, ao Edemar, ao pessoal que convive contigo diariamente. Por trás dessa aparência de tranqüilidade da Jane, eu sempre fico imaginando que existe uma broquinha funcionando, furando as pessoas e descobrindo aquilo que a gente teima em esconder, guardar ou teme em enfrentar, a Jane de repente toca a broquinha do dentista na cárie e daí a gente dá o grito e descobre que está ali, inteiro, ou pelo menos com possibilidade de se reiteirar-se após esta fragmentação.

Eu acho que a proposta do Ver. Brochado da Rocha foi extremamente oportuna e merecida. Não vou falar no nome do Prêmio porque acho que o Ver. Flávio Coulon já o fez aqui, esta ligação tão importante da figura do Érico com a figura da Homenageada de hoje - o Érico, que dá nome ao Prêmio - apenas registrar que esta Casa tem sido, pelo menos, feliz nas homenagens que tem prestado, dentre outros, ao Nejjar, a Scliar, a Lia Luft, alguns nomes que realmente que dignificam a literatura do Rio Grande do Sul e esperar que essa galeria se mantenha neste nível, mas sobretudo esperar, Jane, que, depois desse prêmio, continues escrevendo e produzindo o teu trabalho, que nós, realmente, precisamos disso no nosso dia-a-dia. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR.PRESIDENTE: É praxe da Casa que o autor faça a entrega do Prêmio ao homenageado, porém vou-me permitir ao Professor Felizardo, como Secretário de Cultura do Município de Porto Alegre, que o faça.

 

(O Prof. Joaquim José Felizardo faz a entrega do Prêmio à Homenageada.) (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra a nossa Homenageada, Sra. Jane. Fraga Tutikian.

 

A SRA. JANE TUTIKIAN: Exmo. Sr. Brochado da Rocha, Presidente desta Casa, Srs. Vereadores, meus Senhores e minhas Senhoras. Trago comigo a convicção de que a perfeição dos momentos não se estabelece num tempo futuro, mas num momento mesmo que se realiza, e esse é para mim um momento de rara emoção. Sinto-me extremamente honrada, ao receber de minha Cidade, através da Câmara Municipal, por proposição do Ver. Brochado da Rocha, a quem agradeço, o prêmio literário Érico Veríssimo. E tanto mais honrada por ter, neste meu momento, que tomo a liberdade de dividir com os Senhores, o meu nome ligado ao do Érico, que, divisando a historia, ao contrapô-la com o texto de ficção, definiu o caráter humanista de sua literatura, na concepção que tinha, que o homem pode, com seus próprios meios, melhorar a sua vida e a de seu semelhante, na terra.

É na arte que o artista encontra seu compromisso com tudo aquilo que o fere na vida. Quando o escritor senta sozinho diante da maquina, quando ele senta para viver mundos e pessoas inventados, quando os outros lá fora vivem de verdade, certamente não é para fugir ao seu destino. A maior força do escritor é ser um escritor. É como diz Lawrence Diurel, "é só no silêncio ativo do  artista, que a realidade pode ser elaborada, e revelada naquilo que ela tem de mais verdadeiramente significativo." É o que nos traduz Érico Veríssimo em "O Prisioneiro", quando ele coloca "as palavras podem ser sombras, que forças possuem essas sombras, que magia." Nós devemos defendermos de toda palavra, de toda a linguagem que nos desfigure do mundo, que nos separe das criaturas humanas, que nos afaste das raízes da vida. E esta é, sem dúvida, a maior lição a nortear, talvez por caminhos outros, o meu próprio fazer literário: a humildade prevalecer sobre o orgulho. Há portos difíceis, e os meus amigos escritores sabem disso, difíceis e, às vezes, aparente, desesperadoramente inalcansáveis, nessa luta de quem tem como instrumento a palavra. Mas há o sentimento, mas há uma crença profunda e absoluta no sentir, que revela o homem como começo e como fim.

Recebo esse Prêmio, Senhores, num transbordar de sentimentos; recebo o Prêmio Érico Veríssimo, como uma resposta de amor, ao amor devotado à criatura humana, à palavra, à literatura. A todos o meu reconhecimento. Muito obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convido os oradores da Casa, convido a nossa Homenageada, antes de encerrar a Sessão, a oferecer nossos agradecimentos às pessoas que direta ou indiretamente contribuiram para esse ato. Gostaria, me apropriando de uma parte do discurso do Ver. Antonio Hohlfeldt, mas que apenas ratifica o que S.Exa. disse, quero deixar aqui escrita e mencionada a importância que esta Casa tem dado ao dar o título de literatura Érico Veríssimo. Se não me falha a memória, nós até hoje oferecemos o título a Nejar, Maurício Rosenblat, Luiz Miranda, a Lia Luft, mas foram raros e, sobretudo, todos eles muito comedidos. Até este momento, este título foi concedido com muito cuidado. Acho que o Antonio Hohlfeldt foi muito feliz em referir o fato e esperamos que todos aqui presentes cooperem com a futura Câmara de Vereadores da próxima legislatura e que ela mantenha este nível e qualificação e que não faça desses títulos instrumento de demagogia, mas sim recolha aquilo que a Cidade consagra, para escrever em pergaminho. Foi muito feliz o Antonio Hohlfeldt ao referir, é um dado a mais que ofereço aos Senhores para meditarem e a todos nós para cuidarmos desse detalhe, com a finalidade de não desvalorizar algo que nos é muito caro, não só à Homenageada, mas a todos nós e é importante para a Cidade de Porto Alegre. Peço escusas por me apropriar do alerta dado pelo Hohlfeldt, mas achei ele próprio, em se tratando da última Sessão Legislativa dessa Nona Legislatura, de vez que deverão ocorrer eleições em 15 de novembro. Uma tarefa a mais para pensar. A Casa foi profundamente honrada em conceder o título à Escritora Jane Fraga Tutikian, neste dia, e, sobretudo, engrandece a Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nada mais havendo a tratar, declaro encerrados os trabalhos.

 

(Levanta-se a Sessão às 18h08min.)

 

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